A propaganda eleitoral no Brasil me remete a um teatro. Mas, um teatro de texto superficial inconsequente, antipedagógico, na qual os atores não passam nenhuma verdade.
Entretanto, ela me faz lembrar do "teatro do absurdo", criado por Samuel Beckett, escritor, ensaísta e dramaturgo irlandês, prêmio Nobel de Literatura em 1969, considerado um dos mais importantes dramaturgos do mundo, sendo referência internacional no teatro e na Literatura do século XX.
O "teatro do absurdo" com uma linguagem reflexiva e revolucionária, trouxe para o palco a crise espiritual de uma humanidade sem apoio aos sistemas metafísicos. Abordou a apoteose da solidão humana e sua insignificância. Tudo sem vislumbrar a esperança.
Na peça "Esperando Godot", Beckett faz uma análise da condição humana, colocando o ser humano em xeque-mate, e o que poderia parecer absurdo, fica angustiantemente normal. A sua intenção não era contar uma estória e nem que a plateia voltasse satisfeita para casa, o que Beckett pretendia, era revelar que a vida não era fácil e bela como muitas pessoas fingiam ser. Ele estava preocupado em fazê-las refletir/pensar sobre a condição humana e, como resultado, operar mudanças nas mesmas.
"Esperando Godot" retrata ironicamente a espera, apenas a espera interminal por alguém ou algo que nunca chega. São cinco personagens em cena, a peça começa e termina da mesma maneira, que comparando a nossa vida, pode significar que o tempo passa, mas as pessoas esperam, esperam que algo aconteça e transforme suas vidas.
A peça foi escrita em 1932 e discorre sobre a miséria do homem e do absurdo da sua condição, criando suspense e tensão dramática, como na nossa vida. É a visão trágica do homem e do universo.
O caráter inovador de Esperando Godot é bem atual, pois revela a perda de alguns valores éticos e morais do mundo pós-moderno. Expõe o modo de vida e de uma sociedade que se esvai a cada momento. O homem contemporâneo tem a identidade estilhaçada e, sem aparente destino, mas que busca uma realização. Entretanto, esse buscar se escoa no absurdo do cotidiano.
Enfim, o "teatro do absurdo" de Samuel Beckett, apresenta um humor pessimista e cáustico, mas revelador, pedagógico e filosófico e, sobretudo, verdadeiro.
É possível identificar algo em comum entre a peça "Esperando Godot" e a propaganda eleitoral brasileira? Sim. Ambas provocam riso. A peça, apesar da abordagem trágica, arrancava risada da plateia. A propaganda eleitoral tem também se configurado num "teatro do absurdo ao avesso". Não ensina nada e não leva a nada. O palco é escuro, sujo e nada inteligente. As peças são mal redigidas e as cenas mal dirigidas e interpretadas. O ensaio improvisado mostra o desfile de caras e bocas de personagens que não convencem. Os diálogos são recheados de promessas, de mentiras, de loucuras e de candidatos que querem apenas se arrumar. Basta ouvir dos atores e suas propostas, conhecer seus acordos e alianças para se concluir sobre o "vazio" das candidaturas e constatar que a mudança política é uma quimera.
Este é o palco da política brasileira. Há muito a plateia não prestigia, nem aplaude em cena aberta, porque o que sobrou foi desalento e decepção. O medo vence a esperança.
Para quem acompanha a propaganda pela TV e rádio, certamente tem noção de como será o nosso próximo Congresso, Câmara e Assembleias. A sensação é que, se houver renovação, pouco ou nada mudará. O funcionamento dessas casas está em descrédito. O brasileiro acredita que tudo será como antes: privilégios, corrupção, gastos superfaturados e impunidade.
Por isso, o eleitorado está tão distante e desinteressado do processo eleitoral, sinalizando que ele já deu o que tinha que dar.
Dessa forma, vale dizer que a representação política no Brasil precisa ser recriada, reinventada ou revitalizada, e, ainda que marqueteiros criem cenas mirabolantes para conquistar a simpatia da população, o discurso está desgastado, fragmentado e o eleitor percebeu que suas reivindicações estão em 2º plano, pois acabada a eleição somente os acordos formados no decorrer do processo eleitoral, terão importância.
Diante desse cenário que não convence, está difícil suscitar esperança no eleitor. O sentimento de impotência diante do “mundo da política” é entendido como sendo ele incapaz de promover as transformações que venham beneficiar a sociedade com políticas emancipatórias e não só compensatórias. Por outro lado, o eleitor tem percepção que o seu voto vale muito pouco. E, é ainda com o sentimento da impotência que muitos eleitores se preparam para votar em branco ou nulo, o que pode ser um protesto consciente.
Porém, neste 4 dias que antecedem às eleições de 5 de outubro, vale lembrar as manifestações de junho de 2013, quando expressiva parcela da população desfilou a sua indignação, passando por cima de governo, partidos políticos e imprensa. O clamor das ruas deixou um recado: é necessário mudar padrões de gestão, melhorando significativamente os serviços públicos, com destaque para a saúde, educação, segurança e mobilidade urbana. É preciso dar um basta aos escândalos que flagram atores políticos nos mais diversos palcos da corrupção. É imprescindível realizar a reforma política, acabando com os discursos partidários, que pregam mudanças, para ficar tudo como está.
O certo é que estamos às portas de mais uma eleição da qual toda nação dependerá nos próximos quatro anos. E como será o país a partir de 2015 ? Que políticas serão implementadas para vencer desafios enormes como a crise econômica, o desemprego, a redução de benefícios sociais e a terrível inflação ? De acordo com especialistas, o próximo presidente, dificilmente vai alterar programas como o Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida e o PROUNI. Estes programas estão nos braços da sociedade brasileira que se consolidaram como política pública eficaz para os mais pobres.
Enfim, este é um momento importante. É hora de eleger candidatos capazes de acabar com a corrupção e os privilégios em todos os níveis da gestão pública. E, mesmo com o sentimento de descrença, se você tem um candidato com perfil de trabalho, compromisso, competência e credibilidade. Vote nele. Mas acompanhe a sua atuação, cobre todos os dias o que ele prometeu e depois de eleito, não precisa bater palmas, nem jogar tapetes para ele passar. Ele também será um servidor público e foi eleito para trabalhar.
Porém, se a esperança em dias melhores não vencer o desalento, use a política da compensação. Apegue-se as artes, a música, a poesia. Elas são capazes de nos emocionar e nos alegrar. Aprecie um quadro de Frida Kahlo, leia a poesia de Adélia Prado, escute a música de Cazuza. Ele poeticamente pontou: "Decidi não ficar mais triste. Certas coisas não valem minha dor." Ou, ainda, vá ao teatro e se deleite de rir com a peça "Acredite, Um Espirito Baixou em Mim". Mas vote!