Foto meramente ilustrativa
Com uma população carcerária estimada em 8.600 pessoas, Ribeirão das Neves articulou uma solução para evitar fraudes no cumprimento de sentença dos apenados. Trata-se do projeto Parcerias no Trabalho Externo, iniciado no final de 2013 na Vara de Execuções Penais (VEP) da comarca, a partir da observação de operadores do direito – juízes, promotores e advogados – de que muitas vezes era difícil saber se os detentos estavam de fato trabalhando nas empresas.
A ideia proposta pela titular da VEP de Ribeirão das Neves, juíza Míriam Vaz Chagas, é simples: criar um cadastro de empresas privadas que tenham firmado parcerias com o Estado, as quais atestem para o poder público que o serviço para abater dias da pena está sendo efetivamente prestado; e dar prioridade ao encaminhamento daqueles presos que obtêm a progressão ao regime semiaberto ou já iniciam o cumprimento da pena neste regime. A iniciativa concorreu ao Prêmio Innovare de 2014.
No projeto, as parcerias são celebradas por convênios. O sentenciado só pode trabalhar em empresas cadastradas nas respectivas unidades prisionais, o que já vem determinado na própria decisão judicial concessiva do benefício do trabalho externo. A magistrada diz que refletiu profundamente para elaborar o formato. "Percebi a incidência de reiteração delitiva e de burla aos requisitos estabelecidos na decisão judicial, quando o deferimento do benefício se dava mediante a apresentação da simples proposta de emprego", explicou, ressaltando que algumas empresas sequer eram constituídas regularmente.
Alcance social
A partir daí, segundo a juíza, o Judiciário deslocou o foco de sua atuação para a ressocialização, pois a fiscalização da atividade laborativa exercida pelo sentenciado não é feita pelo ente estatal, mas é assegurada pela parceria. Por outro lado, a medida permitiu a alocação imediata do apenado em uma vaga de emprego, diminuindo o tempo de espera até a implementação do benefício e dando uma resposta a quem deseja pagar sua dívida à sociedade e recomeçar a vida como cidadão.
"O trabalho externo concedido anteriormente significava um verdadeiro álibi para a impunidade, seja porque a fiscalização estatal era inexistente, seja porque as propostas de emprego apresentadas frequentemente se revelavam fraudulentas. Mas a cooperação, feita da forma correta, pode render frutos para ambas as partes, pois o empresário não tem obrigação trabalhista nem de natureza previdenciária em relação ao preso, cabendo-lhe, basicamente, recolher o valor de um salário mínimo para cada empregado", esclareceu a magistrada. Ela acrescenta que, como parte da cooperação, a empresa se compromete com o transporte do preso, buscando-o na unidade prisional e trazendo-o ao fim da jornada, que não pode ser superior a oito horas diárias.
Além da fiscalização eficaz, o projeto representa uma desburocratização e uma situação vantajosa para diversos atores: o sentenciado tem a real possibilidade de se encaixar futura e formalmente no mercado de trabalho, o empresário aufere ganho financeiro direto com o aproveitamento da mão de obra presidiária, o sistema prisional se beneficia de um ambiente menos agressivo, a comunidade recebe um indivíduo ressocializado e o Judiciário exerce sua função de reeducar.
Esperança para a caminhada para frente
Atualmente, dos 2.843 sentenciados ao regime semiaberto, em torno de 1,5 mil (60%) estão engajados no trabalho externo. Essas pessoas também têm a oportunidade de participar de projetos educativos, pois a comarca dispõe inclusive da modalidade prisional do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Segundo a juíza Míriam Chagas, já há três anos as provas ocorrem em dias especiais, nos próprios estabelecimentos prisionais.
"Todas essas ações têm o papel de mostrar ao sentenciado que alguém zela por ele, que existe um esforço para ele retornar ao seio da sociedade", destaca a titular da VEP de Ribeirão das Neves. A magistrada explica que a disponibilidade de vagas na comarca é flutuante, pois depende do momento econômico e de fatores como a época do ano (em janeiro, um mês de férias coletivas, o número de postos cai) e que no momento existem nove empresas parceiras.
Com informações do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG)