Sabe quando o rapper Crioulo fala em Subirusdoistiozin que “tem uns menino bão ai”?, talvez ele ainda não conheça os meninos de Neves (ou do Justinópolis como eles gostam de brincar), mas os cidadãos nevenses são cidadãos do mundo e estão desbravando o mundo da internet.
Com a democratização dos meios de comunicação e a ampliação do acesso à internet, a periferia passou a se conectar na rede mundial, e então a internet deu potência a novas vozes, produções, humor e também possibilitou que um novo retrato da realidade local seja divulgado, sob uma nova perspectiva, não necessariamente mais bonita ou prosaica que o que vemos em noticiários (afinal as coisas não são apenas boas ou ruins, esse maniqueísmo limita nossa visão de mundo), mas agora temos uma perspectiva de quem vivencia situações do dia a dia de Neves e das periferias em geral, com humor, sensibilidade e com vontade de se comunicar e conectar a outros lugares.
O pesquisador Henry Jenkins ao analisar o atual cenário cultural da modernidade, aponta que este se caracteriza pela apropriação e reconfiguração de conteúdos e de uma produção midiática. Ele usa o termo cultura da convergência não por acaso, segundo Jenkins são três fenômenos distintos, mas interligados entre si que configuram a convergência: o uso de diferentes mídias (vemos aí claramente a importância das redes sociais), a cultura participativa (parcialmente propiciada pela interação nas redes) e a inteligência coletiva (essa que está em constante processo de desenvolvimento a partir das novas possibilidades de escolha que nos deparamos diariamente). A cultura da convergência é um fenômeno que tem modificado as comunicações e o modo de se encarar a produção de conteúdo em todo o mundo. E as periferias têm conquistado um papel fundamental nesse processo. Em paralelo a essa convergência de comunicações, interações e conteúdos, os meios de comunicação tradicionais, que atuam em uma única via, transmitindo informações pré-selecionadas ao público, passam por uma constante ameaça de esgotamento, caso não dialoguem com as novas formas de interação.
Fato é que a cultura da convergência acertou em cheio a indústria do entretenimento, que não é mais a mesma gigante centralizadora de produções como antigamente. E graças a galera que literalmente “meteu a cara” pro mundo e convidou seus espectadores a participar e interagir nas redes sociais, vemos experiências de sucesso em formatos que possibilitam maior interação e participação direta do público no conteúdo, como Instagram, Twitter, Tiktok, Youtube e outras redes sociais.
Além de conquistar centenas de milhares de seguidores nesses canais, a galera de Neves também está conquistando seu espaço nos meios de comunicação tradicionais (quem nunca viu o @colemarkin em algum programa esportivo precisa urgentemente ir ao youtube). Importante ressaltar que em um contexto de convergência, as grandes mídias são complementares às mídias individuais e de base local. Contudo, é necessário ainda a consolidação das novas tecnologias de comunicação e a possibilidade de se produzir conteúdos locais, além de promover informações locais de forma descentralizada e horizontalizada. Essas produções impulsionam o desenvolvimento jornalístico e cultural em ambientes digitais e possibilitam a valorização do local e o reforço de identidades culturais, que passam a configurar como fontes básicas de significados sociais em contraste com o processo de comunicação habitual da grande mídia.
A forma que os blogueiros da periferia têm se tornado influenciadores, além do formato de seus conteúdos, diz muito respeito a interação que conseguem de públicos, estes por sua vez são bem específicos e se sentem representados nas piadas, causos e aventuras que a galera posta na rede, levando assim, para milhares de lares, celulares e outras formas de conexão o que normalmente não teria espaço ou representatividade nas mídias consolidadas. Tudo isso configura um fenômeno social muito interessante e esse debate ainda vai dar muito pano pra manga. Enquanto isso, estaremos atentos ao que nossos meninos andam produzindo, de “Neves pro Mundo”.
E vc conhece algum influencer da quebrada?
Texto escrito em colaboração com o sociólogo Tharcio Elizio, mestre em Sociologia Urbana pela UFMG.