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Wagner Dias Ferreira

Chegou o natal. E todos irão ver filmes ou desenhos baseados no Conto de Natal de Dickens com a inspiradora história do velho Scrooge, escrita em pleno século 19, no auge da revolução industrial inglesa.

O conto descreve as visitas recebidas pelo velho Scrooge na virada da noite de natal sendo, primeiro, o fantasma de seu falecido sócio alertando dos horrores da condenação eterna. Depois de três fantasmas, o natal passado, mostrando como fora uma data alegre e marcante na infância; o natal presente mostrando os familiares de Scrooge registrando sua ausência e ainda o sofrimento do pequeno Tim, filho do funcionário de Scrooge; e o natal futuro mostrando a alegria de todos quando Scrooge está sendo enterrado.

Refletindo, o brasileiro poderia pensar sobre quem seria este sócio condenado à danação eterna do STF. Talvez algum membro do próprio judiciário, talvez do legislativo ou, quem sabe, do poder executivo.

No judiciário, nomes como Evandro Lins e Silva que foi aposentado pelo AI 5, poderia alertar o tribunal para mudar os caminhos a fim de afastar a possibilidade de uma intervenção militar que equivaleria à danação eterna da justiça. Teori Zavaski, que era relator da Lava Jato, poderia declarar que a atenuação da justiça com os envolvidos que não são “de esquerda” irá estimular a impunidade e aprofundar as práticas de corrupção.

No legislativo, Ulisses Guimarães poderia vir como o sócio para dizer que se continuarem a vilipendiar a constituição, a democracia e a justiça sofrerão grande danação. Ou quem sabe, no executivo, o ex-presidente Itamar Franco, que promoveu a transição do impeachement para o plano real, poderia vir e dizer a seus pares que mudem, pois a danação, se mantiverem o procedimento, é certa e severa.

Os fantasmas de natal, sendo primeiro o do natal passado, iriam mostrar que, após a Constituição da República, o STF atuou com maestria afastando a expressão constante na Lei dos Crimes Hediondos que determinava o cumprimento de pena no regime integralmente fechado, incorporando nas penas hediondas a progressividade no cumprimento da pena. Alegre e cheio de uma pujante promessa que emergia em ares de democracia no país.

No momento, o entendimento de que os condenados em segunda instância podem ser presos seria já o natal presente apontando o sofrimento da sociedade com um Tribunal Constitucional que não traz ao país segurança jurídica necessária à estabilização das relações humanas com reflexo no direito.

O natal futuro seria a percepção de que o STF não consegue se desvencilhar de seus compromissos político partidários o que certamente levará o país ao sepultamento da justiça.

Este é o natal que temos e assim se apresenta o natal que teremos. Deus, conforme consta do preâmbulo da Constituição, queira que o STF nesse natal mude seus caminhos, como o velho Scrooge e convoque a sociedade para um dever ser ou seja um futuro sem fantasmas.

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No dicionário, a palavra distinção pode significar separação pelos sentidos ou pelo entendimento e diz sobre a palavra natureza que é a essência ou propriedade de um ser, caráter, índole, temperamento. Daí a expressão "sem distinção de qualquer natureza", emplacada no caput do artigo quinto da constituição federal de 1988, adquirir uma amplitude que poucos aceitam.

Um ser humano presente em território brasileiro gozará de garantias sendo proibido impor a ele qualquer tipo de separação seja pelo que se percebe sensorialmente da pessoa, seja por qualquer tipo de entendimento a respeito dela. No entanto, o que mais se vê ao caminhar ou trafegar pelas ruas do país é pessoas sofrendo distinções.

Quando se vê uma pessoa dormindo nas ruas ela está separada. Sofreu uma distinção em razão do modo de funcionamento da sociedade brasileira. O pensamento que primeiro vem à mente é ela é usuária de drogas, ou seja, a justificativa que acalma a alma de quem constata a situação real já é em si uma nova distinção. Eis que a Constituição veda a "distinção de qualquer natureza" quando usa a expressão "sem" de forma que, mesmo sendo usuária de drogas a pessoa não pode sofrer a distinção. Por exemplo: no Tolerância Zero de Nova York, havia forte preocupação com a criação e manutenção de abrigos para que as pessoas não ficassem nas ruas.

Está muito comum ver na mídia notícias sobre o modo inclusivo com que o Brasil trata os refugiados. Recebe as pessoas de múltiplos lugares do mundo e rapidamente providencia para eles a carteira de trabalho para que circulem no país e possam trabalhar. Sendo este tomado como um forte exemplo do comportamento institucional que não distingue as pessoas. Sim, isso é bom. Mas o tratamento dado aos refugiados de certo modo põe em cheque o modo como se percebem os brasileiros natos. Muitas vezes sem as políticas públicas inclusivas para lidar com realidades extremas.

Quando esteve em Belo Horizonte, o ex-prefeito de Nova York, Rudolf Giulliane, ao falar sobre sua política de tolerância zero na segurança pública (mesmo que se tenha questionamentos a ela) ficou notável verificar uma genuína preocupação com procedimentos sociais, como a criação e manutenção de abrigos, que acompanhavam de perto o endurecimento policial.

No nosso país, temos visto crescer o endurecimento policial e, ao contrário da política de tolerância zero de Nova York, estão reduzindo a preocupação social. É uma coisa de maluco. É como se os governos estivessem propositalmente provocando a explosão da panela de pressão.

É fácil observar que em tempos de franco combate à corrupção no país que há políticos influentes e pessoas ricas condenadas pela justiça recebendo benefícios permitidos por lei, que não são vistos sendo aplicados em favor de pessoas pobres ou de influência política de pouca repercussão, aquelas que têm somente o voto como expressão de influência política, que não gozam os mesmos benefícios dos ricos e influentes.

É por isso que o povo brasileiro precisa cada vez mais continuar pensando, refletindo, compreendendo e aplicando a expressão “sem distinção de qualquer natureza”. Aplicá-la como um princípio norteador da educação, para que não haja distinção de qualidade entre educação pública e educação privada, na defesa social para que não haja distinção entre pobres e ricos perante os órgãos de segurança e da justiça, na interpretação de qualquer texto legal, nos diversos comportamentos humanos, nas decisões judiciais de toda ordem, sempre atentos à igualdade se poderá provocar no país uma grande transformação cultural equacionando assim muitas distinções que precisam desaparecer.

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Dados de 2014 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre o sistema prisional brasileiro mostram que há  357.219 vagas para manter pessoas presas no país, com déficit de 728.235 vagas. Denota um sistema caótico e que no desespero da situação leva o Estado a buscar soluções mirabolantes que podem se mostrar caóticas continuadoras desta perplexidade. Também há comparação com outros países e observa-se que a realidade pode ser diferente, com menos criminalidade na sociedade, com um encarceramento mais digno. Por exemplo, a Alemanha tem encarceramento de 78/100.000 habitantes e possui uma taxa de 0,8% de homicídios. O Brasil tem um encarceramento de 358/100.000 habitantes e uma taxa de homicídios de 21%, sendo um indicativo de que o encarceramento mais digno pode reduzir a criminalidade.

Parece normal pensar que o Estado precise de ajuda da iniciativa privada para o encarceramento de presos.  Mas esta não é uma verdade que deva ser aceita sem debate. O abandono do Estado para o sistema prisional levou os presídios a se transformarem em universidades do crime. Lá dentro, os presos estão submetidos a violações constitucionais legais e humanitárias, impondo aos reclusos a conclusão de que o Estado só tem para eles o desrespeito. O sistema prisional precisa mostrar ao preso que ele pode ser respeitado e que deve respeitar a sociedade confrontando-se com as consequências de seus atos.

Tudo isso é fruto de um abandono histórico do sistema. Que, sem investimentos, nunca viu a implementação dos mecanismos previstos na Lei de Execução Penal na prática. Encontram-se estabelecimentos prisionais improvisados onde os presos ficam amontoados, mesmo sendo a Lei de Execuções de 1984. Se o Estado iniciar um procedimento sério de investimentos e estruturação do Sistema Prisional para cumprir a LEP, a realidade prisional pode mudar e irá afetar a criminalidade, que hoje segue incrementada pelo sistema prisional.

Qualquer advogado atuando muito em processos de execução penal em Minas Gerais, mais precisamente na Comarca de Ribeirão das Neves, onde está instalada a mais corajosa experiência de presídio de parceria público privada do Brasil pode constatar entraves na experiência "inovadora". Sendo certo que o Estado irá ressarcir os investimentos da iniciativa privada, ele mesmo, o Estado, poderia ter construído as novas unidades prisionais. Bastaria decisão política e coragem.

Um advogado que tem clientes em dois presídios que ficam lado a lado: a Penitenciária José Maria Alkimin e o Complexo Penitenciário Parceria Público Privada pode confirmar que, no público, os presos têm acesso a trabalho e estudos regularmente. E na parceria há dificuldades no acesso a estudos e ao trabalho para o preso que está bastante restrito.  E ainda há as dificuldades burocráticas para cumprimento de benefícios concedidos pelo juízo da execução.

Uma diferença entre os dois sistemas que afeta o funcionamento da nova experiência é que o presídio público mescla agentes penitenciários concursados e efetivos e contratados, permitindo compor contingentes necessários ao trabalho de segurança prisional. Já no sistema privado todos os servidores são empregados pela CLT.

Pensar e planejar, atentos a dados importantes já à disposição da sociedade brasileira, é uma necessidade para que o sistema prisional preste contribuição à redução da criminalidade e não seja um mecanismo de incremento dela.

 

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