"Quem traz na pele essa marca,
possui a estranha mania de ter fé na vida.”
Estes versos de Fernando Brand sintetiza maravilhosamente, o ser mulher. Um ser singular e de múltiplas possibilidades. Um ser que tem o dom do amor e da emoção. Que mesmo nas adversidades, não desiste de lutar por uma vida e um mundo melhor.
No intuito de desvendar o “mundo feminino”, a mulher tem sido sujeito de estudo por parte de filósofos, sociólogos e (d) escrita em prosa e versos, por inúmeros escritores, no mundo inteiro. A escritora francesa Simone de Beauvoir, no livro, “O Segundo Sexo”, afirma que o ser mulher é uma construção, que se estabelece nas relações com o outro, nas suas experiências e vivências ao longo da vida. Também o filósofo alemão, Martin Heidgger, autor do livro “Ser e Tempo”, escreveu que o ser humano se faz nas vivências e experiências de seu tempo. No livro, “A Terceira Mulher”, o filósofo Gilles Lipovetsky, relata o percurso histórico vivenciado pelas mulheres no contexto social, cultural, político, econômico e religioso, abordando também a mulher reconhecida para procriar, perpassando pela exaltação da mulher, cantada em versos e prosa e, por fim, a mulher contemporânea, dona de si mesma.
No Brasil, a socióloga e psicanalista, Regina Navarro Lins, no livro, “A Cama na Varanda” aborda a profunda transformação ocorrida nas relações entre o homem e a mulher, a partir dos anos 60. Regina Navarro fala também da eterna busca da mulher pelo amor romântico, a repressão sexual e da manutenção de casamentos que trazem mais sofrimentos que alegria, mas, que são valores que vem de longe e prevalecem até os nossos dias, arraigados à mentalidade contemporânea. Em seu estudo, Regina aponta que, embora a moral patriarcal ainda embutida no pensamento atual, que gera muitos conflitos nas relações afetivas, sociais e profissionais, a mulher tem percebido as suas próprias singularidades, não tendo mais que se adaptar a modelos impostos de fora. Essa mulher que abre hoje, espaços para novas formas de viver, experimentando novas sensações. Um ser intelectual, integrada ao mundo. Uma mulher que se reconhece e se faz ser reconhecida como um ser capaz, tanto social quanto profissional. Um ser que, harmoniosamente, desenvolve um potencial criativo e não mais se limitando ao papel de esposa e mãe. Então, quantas mulheres cabem dentro de uma mulher? “Voltando a Simone de Beauvoir, que afirmou:” Ninguém nasce mulher, torna-se mulher. Cabe afirmar, ser mulher, é de fato, uma construção social, mas que se consolida a partir de suas relações interpessoais realizadas no tempo, espaço e contexto social, no qual está inserida.
Essas obras refletem o modo de ser mulher, que além de ser mãe e profissional, exerce outros papéis, vivendo os diferentes modos de ser mulher. Vale dizer que a mulher contemporânea é o reflexo das suas escolhas e das relações que estabelece com o outro, ou seja, a mulher constrói e re-constrói a sua identidade e a sua história diariamente. Então, mulheres são tantas quantas a imaginação e a fantasia permitirem, sejam elas reais e ou ficcionais.
Por isso, vale lembrar, dentre tantas, mulheres que foram modelos revolucionários e humanitários. Que transgrediram e colocaram na vanguarda o pensamento feminino. Mulheres fortes, cultas e dedicadas à causa que abraçaram. Madre Tereza de Calcutá, que se doou aos pobres, na Índia, Zilda Arns, médica sanitarista brasileira, que salvou a vida de muitas crianças, Nise da Silveira, psiquiatra que revolucionou o tratamento da loucura no Brasil, Frida Kahlo, pintora e ativista mexicana. Frida é considerada uma mulher a frente do seu tempo. Ela se transformou em um ícone do surrealismo e do universo feminino dos anos 50. Angelina Jolie, atriz americana, ativista política e humanitária, que luta pelos direitos humanos e das mulheres, Malala Yousafzai, menina, que luta pelo direito das meninas estudarem, no seu país, o Paquistão. Malala foi ganhadora do prêmio Noel da Paz, em 2014.
Na Literatura mundial e brasileira são muitas as personagens femininas, fortes, sofredoras, sedutoras e enigmáticas. Molly Bloom, no livro Ulysses, de James Joice, proporciona um passeio pela pluralidade da alma humana. Ema Barory, em “Madame Bavory”, de Gustave Flaubert, tem personalidade complexa: delicada, egoísta, dramática, ingênua... Tereza, em “A Insustentável Leveza do Ser”, de Milan Kundera, é um personagem que carrega dores e traumas, porém é fascinante e instigante. Na literatura brasileira, como não citar a personagem emblemática, Capitu, do livro “ Dom Casmurro”, de Machado de Assis. Em Capitu cabem várias mulheres, o que faz dela umas das personagens mais incríveis já (d)escrita, da nossa literatura. Por fim, Macabéa, em “A Hora da Estrela”, de Clarice Lispector. Macabéa, pouco ambiciosa se entrega apropria sorte. Sua riqueza é a sua pobreza.
Dia Internacional da Mulher
Dia 8 de março, dia dedicado à mulher, é uma marca simbólica para lembrar um histórico de luta, reivindicações, conquistas e avanços, mas também para denunciar um cotidiano de exploração, preconceito, opressão, discriminação e, principalmente, da violência, que fazem vítimas mulheres, em todo planeta, sejam elas ricas, pobres, cultas, analfabetas, brancas ou negras.
A revolução Industrial e os avanços tecnológicos e científicos, que marcaram o século XX e, trouxeram mudanças significativas nas crenças e atitudes em relação à sexualidade, a liberdade sexual, que favoreceu à mulher o direito ao sexo com prazer e com o parceiro desejado. A descoberta das pílulas anticoncepcionais que permitiram a mulheres fazer sexo sem engravidar, mas não as livraram de um companheiro violento, que as exploram, humilham e as agridem, a cada instante.
O direito de votar e trabalhar não proporcionou a elas, mais dignidade no trabalho, mesmo sendo maioria nas fábricas, nas redações de jornais, rádios e tvs, nas universidades, no comércio, nos hospitais e tantos outros segmentos profissionais. As mulheres ainda sofrem uma jornada excessiva de trabalho e com baixos salários, o que comprova a desvalorização profissional, mesmo mostrando competência e criatividade. Mas, combater a violência na qual é vítima, diariamente, é principal luta da mulher, hoje, no mundo inteiro.
No Brasil, segundo pesquisa Data Folha, mais de 500 mulheres são agredidas a cada hora. A Central de Atendimento à Mulher denunciam que os 51,06% dos atendimentos correspondem à violência física e 31,10%, a violência psicológica. Esta pesquisa mostra ainda, que 70% das mulheres, sofrem violência dentro de casa. Vale dizer então, que o Dia Internacional da Mulher, além de comemorar as conquistas pessoais, culturais, sociais, políticas e religiosas das mulheres nessa trajetória histórica, serve para também denunciar a violência que assola todas elas. Que políticas públicas de apoio à mulher, sejam de fato viabilizadas. Que programas de proteção e acolhimento possam chegar a todas a mulheres, em todos os cantos do país. Que as mulheres pobres possam ter mais acesso aos exames preventivos de mamografia e do colo de útero e, principalmente, que a Lei Maria da Penha possa realmente punir os seus algozes.
Que este dia dedicado à mulher possa lembrar também as mulheres anônimas, comuns, trabalhadoras, mães, esposas, namoradas, amantes… Que as Marias, as Raianes, as Giseles, as Gabrielas... possam ser felizes, no trabalho, no amor e viver toda magia de ser mulher, colocando em prática toda a experiência que o mundo feminino lhes conferem.
Este texto eu dedico a Noida, moradora do bairro Rosaneves, que todo dia levanta às 4 horas da madrugada para trabalhar, voltando só à noite. Noida esbanja alegria e bom humor, apesar das dificuldades enfrentadas no seu dia a dia.