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Dá nada pra mim, será?

"Dá nada pra mim”, quantas vezes você já escutou essa expressão nos últimos anos? Provavelmente várias. Eu, por exemplo, na condição de professor da Rede Pública quase que diariamente escuto alunos reproduzindo essa já célebre expressão indiscriminadamente. Mas o que de fato está por trás dessa afirmativa? Quais são as consequências de acreditarmos e mais ainda estimularmos os jovens acreditarem nessa expressão

Podemos entender essa afirmação, quando reproduzida por um menor, principalmente quando esse pertence a um grupo familiar submetido a um quadro de vulnerabilidade social como a internalização do próprio jovem, negro (preto ou pardo), morador de periferia, oriundo de família de baixa renda envolvido ou não em atividades criminais de um discurso perigoso encabeçado por parte significativa da sociedade brasileira a qual ainda insiste em acreditar que a simples criação ou modificação de uma lei poderia resolver todos os problemas da criminalidade no país. Assim, parte sensível da população brasileira acredita que com o endurecimento das leis, a redução da maioridade penal e a criminalização da pobreza teremos um país mais seguro. Esses assim ignoram o fato de que os países que resolveram o problema da criminalidade, os quais apresentam índices sustentáveis de violência, não investiram em criação de leis mais rígidas, mas sim em políticas de inclusão social como educação de qualidade para todos, combate as desigualdades (econômicas, raciais, de gênero geracional), politicas voltadas para a juventude (nas áreas de lazer, esporte e cultura) e Inclusão no mercado formal de trabalho das populações em condição de vulnerabilidade.

Para respaldar esse argumento da ineficácia do endurecimento das leis como solução para a criminalidade podemos citar o estudo do Professor Luís Flávio Gomes intitulado "Beccaria (250 Anos) – e o Drama do Castigo Penal: Civilização ou Barbárie?" , onde o autor nos mostra que nas ultimas, décadas no Brasil, mais de setenta por cento das leis que discutiam a questão da criminalidade propunham alteração no código penal no sentido de endurecimento das Leis, mas essas alterações quando implementadas pouca efetividade tiveram sobre a redução da criminalidade no país, que por sinal viu nas ultimas décadas a explosão da criminalidade, com a estruturação do tráfico de drogas e do crime organizado.

Voltemos à análise da simbólica expressão "Dá nada pra mim" ela explícita por parte desses jovens uma falsa sensação de impunidade que a eles é atribuída, pois por serem menores, a justiça lhe confere mediante ao Estatuto da Criança e Adolescente e especialmente a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que também é pejorativamente chamada como "Direitos dos Manos" a licença para cometer crimes. Tais posicionamentos da sociedade brasileira demostram a total ignorância e desconhecimento sobre os conteúdos desses dois documentos, os quais são primordiais para o processo civilizatório que a humanidade viveu nos últimos séculos. Em especial os direitos humanos que é um documento que busca deixa claro que todos os seres humanos, independente de raça, cor, credo ou nacionalidade tem direitos inalienáveis como direito a vida , a liberdade , a propriedade, a educação, a um emprego digno e a não ser vitima de justiça sumária.

Outro efeito nocivo deste posicionamento da sociedade Brasileira que é cristalizado na expressão "Dá nada Pra mim" é estimular parcela da juventude em condição de vulnerabilidade social a entrarem para o mundo do crime, pois o próprio discurso corrente afirma que pelo fato de ser menor de idade os jovens não enfrentarão maiores consequências frente ao fato de se enveredarem para o caminho da criminalidade seja no tráfico de drogas, realizando furtos, roubos e até mesmo crimes hediondos como assassinatos e estupros, afinal de contas "Não da Nada Pra Mim".

Esse discurso cai por terra quando analisamos as estatísticas apresentadas pelo Mapa da Violência e utilizadas pelo Programa JUVIVA – Juventude Viva – realizado pelo governo Federal no Ano de 2012 em parceria com o Observatório da Juventude da UFMG.

Esta pesquisa mostra que em 2012 o Brasil apresentou o astronômico número de 50 mil assassinatos - (no ano de 2017 chegamos a marca de 60 mil assassinatos), números esses que intrigam pesquisadores internacionais, pois essas são estatísticas dignas de países em guerra como Síria e Iraque. Recortando os dados verificamos que desse total 60 por cento dos mortos era composto por jovens de idade entre 14 a 29 anos, a maioria - setenta por cento - composta de negros (pretos e pardos), no que se referem ao sexo das vitimas de homicídio 91,5 por cento eram homens. Para concluir, o perfil de quem é assassinado no Brasil a maioria das vitimas eram moradores de periferias sociais – vilas, favelas e bairros pobres - com baixa escolaridade e representativo número de pessoas que se quer ingressaram no ensino médio e oriundos de famílias de baixa renda, ou seja, justamente o perfil , como relatado acima, de quem é estimulado a incorporar o discurso do "Dá nada pra mim". Portanto, podemos concluir através das estatísticas que o discurso qual defende a falta de maiores consequências do envolvimento de jovens com a criminalidade não é real, pois para esse grupo a expectativa de vida é bastante baixa e nesse curto período de vida acumulam sucessivas passagens por centros de ressocialização, que de ressocialização só possuem o nome, e por cadeias que são verdadeiras masmorras, ou seja , para esses jovens definitivamente o crime não compensa, mas para completar o ditado popular, tudo conspira a favor.

Os dados apresentados pelo mapa da violência no Brasil levaram a alguns órgãos de defesa da juventude a afirmarem que o Brasil passa por um processo silencioso de genocídio da juventude pobre e negra, pois mantidas essas estatísticas por vários anos teremos o aniquilamento desse seguimento da população, o qual historicamente não tiveram os seus direitos básicos garantidos como direito a moradia , direito a educação de qualidade , direito a um emprego digno e agora tem o seu direito mais fundamental, que é o direito a vida, violado. Claro que alguém vai ler esse artigo e afirmar que eu estou propondo que protejamos os "vagabundos", mas como o estudo do Professor Luís Flavio Gomes analisou legislações penais de mais de 70 países constatou, não são leis mais rígidas que combatem a criminalidade, mas sim a implementação de direitos básicos que promovam a diminuição das desigualdades, basta verificar que os países que tem as menores taxas de criminalidade são também os que apresentam os melhores índices de distribuição de renda e educação, ou seja, esses países ao invés de questionarem o texto da Declaração Universal dos Direitos Humanos o colocaram em prática.

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