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A menina da caixa

Foi num sábado. Bonequinhas enfileiradas na porta de um depósito fechado, no centro da cidade, me chamaram a atenção. Ao lado delas, uma pequena mulher, de olhar meigo ou quem sabe triste, nos seus trinta anos. A cena à distância não era incomum, mas eu fiquei incomodada. Ao me aproximar, a curiosidade do outro lado da rua, se transformou em encantamento.

A mulher estava sentada e ao seu lado, bonequinhas de panos, rostos perfeitos e, lindamente, vestidas. Havia também uma caixa, que de imediato, pensei guardar mais bonecas. Mas, para minha surpresa, dentro da caixa havia uma menininha, ou melhor, uma bonequinha de verdade: olhos grandes, cabelos pretinhos e, que, ao olhar para mim, sorriu. Aí, eu quis saber da mãe se ela não achava ruim ficar ali. A mãe disse que a menininha nunca chorava, que era um doce e que ela a trazia porque não tinha com quem deixar. Que o dinheiro das vendas das bonecas, confeccionadas por ela, era vital para sua família, que passava por necessidade, e que o marido estava desempregado.

Meus olhos não desgrudavam da bonequinha e ela sempre me correspondia com um sorriso. Peguei-lhe as mãozinhas e dei-lhe um beijo. Sentido-me na obrigação de ajudar aquela mulher e a sua filhinha, comprei uma boneca bem colorida e que parecesse com a de verdade. Mas, a minha vontade era levar a bonequinha da caixa para mim.

Nos sábados seguintes, e, durante meses, os meus olhos não deixavam de apreciar aquelas duas figuras que me encantava. Até que um sábado elas não estavam mais lá. Confesso que senti falta, mas não consegui descobrir onde moravam. Pensei que a família pudesse ter mudado da cidade ou quem sabe, o marido arranjara emprego e a mulher não precisava mais vender bonecas na rua. Porém, aquela cena ficou gravada no meu olhar e me perseguia vida afora.

Os anos se passaram e eu nunca mais vi ou tive notícias daquela mulher e da sua filhinha. Um dia, fui escalada para entrevistar uma artesã, que tinha recebido um prêmio sobre presépios. Todos comentavam que o seu trabalho era maravilhoso e ela tinha o seu próprio ateliê. Ao vê-la, imediatamente a reconheci. É ela. A mulher das bonequinhas. Estava mais velha, mais forte, entretanto, a calma e olhar eram inconfundíveis. Eu fiquei emocionada e foi quando relembrei o seu nome. Naqueles sábados, o seu nome e o da filha eram tão importantes para mim. Então ela me disse: "Estou trabalhando aqui na Secretaria e faço artesanato" e me convidou para ver. "Lindo, muito lindo! E a sua filha?" "A Bianca? Ela tem oito anos e gosta de ler e escrever poemas".

Dias depois pude rever Bianca. Que vivacidade! Os olhos alegres e espertos eram os mesmos.

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