Se sou o Ribeirão, não sei
Sei que ele escoa em mim
entre moitas de capim,
relvas, flores e avencas.
Traz-me saborosas pencas
de recordações, saudades,
coisa que, na verdade,
são sonhos que trago em mim.

Se sou Ribeirão, não sei
Sei que o levo comigo
e deixá-lo não consigo
quando fecho os olhos e vejo
prateados lambaris
enchendo aqueles jequis
e que no vento inda escuto
mesmo que por um minuto
as canções de seu acalando.

Porque telúrica avidez,
espiritual prenhez,
se sou barro de olaria?
E por que, então saudades
de tantas alegorias:
dos foguetes, missangueiras,
e uma lenta jardineira,
dos mascates em pregões
na festa da padroeira?

Sou o brejo, o preá, a taboa, a saracura
Sou o melado da cana e o leite do Retiro,
É por isso que prefiro
a recordação mais leve e pura
ser aquele “capitão”
feito com as pontas dos dedos
que se almoça mais cedo
com carinho das mãos.

Eu ainda sou a crença
do chá pra qualquer doença
ainda vejo o saci
que só com uma perna salta
Sou o tudo, sou o nada
pois sou só o que me falta
E se levo a mão ao peito
nem sinto mais coração,
pois o que pulsa lá dentro
é o velho Ribeirão.