"Desenvolvimento sem educação é criação de riquezas apenas para alguns privilegiados"
Artigo escrito a quatro mãos por Paulo Tomaz, Graduado em Administração e Mestre em Educação, e Renata Tomaz, Graduada em Comunicação.
A educação é o único caminho para emancipar as pessoas, especialmente aquelas menos privilegiadas. “Desenvolvimento sem educação é criação de riquezas apenas para alguns privilegiados”. Esta expressão foi proferida por Brizola, em 1961, na conferência da União Nacional dos Estudantes. Sem entrar em detalhe sobre a qual dimensão da educação era abordada, pelo contexto é possível inferir que se tratava da educação formal, ou seja, o conjunto de conhecimentos que é adquirido nas escolas e universidades. Além disso, estudos contemporâneos mostram que o desenvolvimento de países, estados e municípios está diretamente relacionado com a respectiva capacidade de produzir, difundir e utilizar conhecimentos.
Desde a década de 1960 até os dias atuais muitas coisas mudaram, porém, a educação ainda se faz útil e necessária. É certo que houve um avanço expressivo em relação ao acesso às instituições formais de ensino, mas ainda há uma discrepância em relação à qualidade do ensino e o desenvolvimento de competências efetivas, principalmente quando se compara diferentes redes de ensino (privada, municipal, estadual e federal) e diferentes regiões geográficas do país (norte, nordeste, sudeste etc.) ou regiões centrais e periféricas.
Entretanto, é preciso perceber que ter o acesso à educação é fundamental, mas não é o suficiente, é preciso, também, que a educação ofertada seja de qualidade e que os alunos estejam engajados no processo ensino/aprendizagem para que o desenvolvimento ocorra efetivamente em todas as suas dimensões. É necessário que haja políticas educacionais que promovam a equidade nas condições de acesso, permanência e desenvolvimento, tanto dos educando quanto dos demais envolvidos no processo.
Enquanto nos preocupamos com a qualidade da educação, muitos gestores públicos e formuladores de políticas vêem os recursos aplicados em educação como gasto e não como investimento e procuram priorizar outras áreas em detrimento desta. História recente de países como Coréia do Sul, por exemplo, mostra que os investimentos coordenados em educação podem colocar o país em posição de vanguarda, principalmente quando se trata de competitividade tecnológica. Na década de 1970 a economia da coréia se equiparava à do Brasil, porém um dos fatores que contribuiu para sua decolagem foi o investimento na formação de capital humano, ou seja, investiram em escolas e faculdades para formar pessoas capazes de lidar com as novas tecnologias que surgiriam. Hoje o Brasil e grande parte do mundo usam produtos coreanos de alto nível tecnológico e com alto valor agregado.
Assim, uma premissa verdadeira é que as pessoas devem estar preparadas para as possíveis oportunidades que possam aparecer. Neste sentido, o papel do governo e demais formuladores de políticas consiste em elaborar instrumentos de políticas educacionais que sejam eficazes de forma que garantam permanência e equilíbrio dos investimentos. Um desses instrumentos que tem contribuído para evitar o desajuste na educação é o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Nesta matéria não se pretende discutir as principais mudanças que estão sendo sofridas por esse mecanismo nem a forma como esses recursos são utilizados, mas tentar conscientizar o leitor de que a mudança na política de financiamento da educação pode impactar, direta ou indiretamente; a curto ou a longo prazo, mesmo aqueles que não tenham relação direta com a rede pública de ensino na educação básica.
Então, antes de tudo, é fundamental saber o que é esse instrumento de política. O Fundeb é um conjunto de 27 fundos (26 estaduais e 1 do Distrito Federal) que serve como mecanismo de redistribuição de recursos destinados à educação básica, ou seja, é como se fosse um grande cofre onde todos os Estados e o Distrito Federal depositam os percentuais de determinadas arrecadações previamente definidos pela constituição e outros instrumentos legais específicos. Além desses recursos, é feita uma complementação com recursos federais. Posteriormente, esses recursos são devolvidos para cada ente federativo (estado ou município) de acordo com o número de alunos matriculados nas respectivas redes conforme informações do censo escolar do ano anterior.
O Fundeb foi criado em 2006 em substituição ao Fundef, que era um fundo com características semelhantes, com tempo de duração pré-definida. Nos últimos anos vêm sendo feitos vários debates públicos sobre um modelo aprimorado do atual Fundeb, que tem como objetivo tornar o Fundeb permanente e alterar a distribuição dos recursos. O Fundo tem por objetivo diminuir a desigualdade de recursos entre as redes de ensino, ajudando os sistemas de ensino a se organizarem no atendimento escolar, dando segurança financeira aos municípios e estados para que eles possam aumentar o número de matrículas.
Em 2019, o valor mínimo do repasse anual por aluno no Fundeb foi de R$3.044,29, isso considerando o fator de ponderação para os anos iniciais do Ensino Fundamental urbano. Embora haja uma ampla discussão sobre o Custo Aluno Qualidade Inicial (CAQI), que é um dispositivo desenvolvido pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que tem como objetivo mensurar o financiamento necessário (calculado por estudante) para a melhoria da qualidade da educação no Brasil, ainda não existe um valor fixo para atingir nível suficiente que garanta um padrão mínimo de qualidade de ensino. Dessa forma, o Governo federal é quem define esse valor.
Do dinheiro que é repassado aos estados e municípios, pelo menos 60% deve ser usado para pagamento do salário dos professores da rede pública. Em caso de saldo remanescente, pode também ser aplicado na remuneração de diretores, orientadores pedagógicos e funcionários, no transporte escolar, na aquisição de equipamentos e material didático, na manutenção e construção de escolas. Em contrapartida não pode ser utilizado para comprar merenda escolar nem remunerar profissionais em desvio e função.
A proposta que está em discussão é que o Fundeb se torne permanente e que, o Governo Federal, que hoje responde por 10% do total dos recursos do fundo, passe a responder por 23% de forma gradativa, sendo: em 2021, serão 12% e em 2022, 15%. Depois eles aumentaram em dois pontos percentuais por ano. Isso permitirá atender mais 17 milhões de estudantes e reduzir as desigualdades nas redes públicas.
Mas afinal, qual o impacto que maior investimento na educação pode ter na vida das pessoas?
Embora os recursos do Fundeb sejam voltados exclusivamente para a educação básica ofertada na rede pública de ensino, seus efeitos impactam toda a sociedade, independente do nível de ensino e do poder econômico. Portanto, alguns pontos devem ser ressaltados.
- Maior investimento na educação poderá contribuir diretamente para a melhoria da qualidade do ensino facilitando, assim, o processo ensino/aprendizagem.
- Quanto mais qualificado estiver o aluno egresso do Ensino Médio, maior possibilidade ele terá de avançar para os níveis mais elevados do ensino, do conhecimento e da pesquisa científica e tecnológica.
- Uma infraestrutura industrial, científica e tecnológica depende de capital humano combinado com uma forte base de conhecimento, cujo alicerce é construído com uma educação básica de qualidade.
- O avanço do conhecimento científico e tecnológico, que ocorre principalmente nas universidades, empresas e institutos de pesquisa, mas que depende de pessoas que foram adequadamente preparadas na educação básica poderá contribuir para a inovação de produtos, processos e serviços que tornará o país mais competitivo no mercado internacional. Somando produtos de alto valor agregado à atual exportação de commodities.
- A oportunidade de acesso à educação e a possibilidade de contribuir para o desenvolvimento, em todas as suas dimensões, não deve ser encarado apenas como um privilégio dos que ocupam uma classe econômica mais favorável, mas um direito de todos.
Diante do exposto, é preciso entender que somos beneficiários ou vítimas das políticas pública, ainda que não estejamos diretamente atuando no setor relacionado ao tema. Portanto, ainda que seja superficialmente, é importante entender quais os possíveis impactos que tais políticas podem ter sobre nossa vida.