"O número de infectados pelo COVID-19 (coronavírus) cresce exponencialmente e o sistema de saúde no Brasil entrará em colapso no final do mês de abril". Essa é a previsão feita pelos especialistas em relação ao avanço da contaminação. O panorama atual faz lembrar a previsão do economista Thomas Malthus, por volta dos anos 1800. De acordo com sua análise, a produção de alimentos seria insuficiente para atender a todos porque a população crescia em progressão geométrica, enquanto a produção de alimentos aumentava em progressão aritmética. Consequentemente, esse desequilíbrio levaria ao surgimento de epidemias, guerras e outras catástrofes.
Em seu ensaio sobre a população, escrito em 1798, Malthus ressaltou que a solução para evitar tal problema consistiria na restrição dos programas assistenciais públicos e no controle do crescimento populacional, especialmente nas camadas menos favorecida da população. Em decorrência disso, recebeu críticas e elogios.
Mas a discussão aqui não é sobre Malthus, até mesmo porque este economista falhou em sua previsão por não levar em consideração o possível avanço científico que permitiu maior controle no planejamento familiar em todo mundo e a aplicação de novas tecnologias no setor agrícola. Além disso, a previsão de Malthus era de longo prazo, porque a dinâmica vivida naquela época era muito diferente dos tempos atuais. Na atual conjuntura estamos falando de uma pandemia, assim, as decisões políticas e tecnológicas devem ser imediatas, consequentemente, as previsões são de curtíssimo prazo, com maior probabilidade de acertos, por conseguinte, as demandas por soluções tecnológicas são também imediatas.
Devido ao avanço do conhecimento científico, especialmente após a década de 1950, acreditou-se que a ciência seria a solução para a maioria dos males que afetam a sociedade, especialmente quando se trata de problemas relacionados à saúde pública. No entanto, o COVID-19 pegou a comunidade científica de surpresa e o conhecimento acumulado ao longo do tempo não está sendo suficiente para desvendar esse enigma e apresentar uma solução consistente em tempo hábil.
Embora, a tecnologia esteja presente, não podemos ser céticos a ponto de pensar que a solução para o problema do coronavírus seja encontrada antes que alguém"próximo" seja atingido e que haja um sistema de saúde que possa atender todos os pacientes com dignidade. A realidade prevista é bem diferente. Primeiro porque mesmo se for desenvolvido um medicamento eficaz contra a doença, até que esse medicamento se torne disponível para atender às necessidades da população levará algum tempo. Segundo, porque de acordo com a previsão, nos hospitais não haverá leitos com os equipamentos necessários para todos os possíveis doentes.
Além disso, é importante lembrar que mesmo com a crise do corona, as outras demandas pelos serviços de saúde, em maior ou menor grau, continuam. Isso mostra a pressão que será exercida sobre o sistema, a qual está em consonância com a definição que o Ministro da Saúde Mandetta atribuiu ao termo colapso, deixando claro que a situação poderá ser pior do que muitos pensam. De acordo com o Ministro "você pode ter dinheiro, pode ter plano de saúde pode ter ordem judicial, mas não há o sistema para te atender".
Portanto, é necessária toda cautela no sentido de evitar a propagação da doença. Pois, de acordo com as pesquisas, em média, apenas um em cada dez infectados pelo vírus apresenta os sintomas. Além disso, na maioria das capitais brasileiras os testes são feitos apenas nas pessoas que estão apresentando os sintomas, ou seja, média de 10% dos infectados pelo vírus. Isso significa que muitas pessoas já infectadas estão freqüentando os mesmos lugares que aqueles que ainda não foram contagiadas.
Neste sentido, enquanto o conhecimento científico e tecnológico disponível não apresenta uma solução para o colapso iminente, é necessário que cada cidadão faça sua parte no sentido conter o avanço do vírus. Como as previsões de Malthus fracassaram devido à contribuição da ciência e da tecnologia no controle do crescimento populacional e no aumento significativo na produção e distribuição de alimentos, devemos agir no sentido de fracassar as previsões dos especialistas, não ignorando-as, mas fazendo nossa parte com o isolamento social e seguindo as demais recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e das demais autoridades até que passe este momento de turbulência.
Finalmente, com a crise podemos aprender muitas coisas. Dentre elas, que a ciência e a tecnologia ainda têm seu espaço no imaginário popular; que a nossa relação com os outros e com a natureza é sistêmica e que a atitude individual pode evitar ou amenizar o sofrimento de muitas pessoas.