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Entre uma fase de grupos em que se classificou com uma rodada de antecedência e uma partida de oitavas de final que decidiu cedo, diante do Chile, a Seleção Brasileira ainda não havia passado por momentos de pressão na África do Sul. Não até as quartas de final diante da Holanda. Ou, mais especificamente, até o segundo tempo. E, quando enfrentou a situação adversa, o Brasil o fez por uma única e derradeira vez.
Depois de jogar um primeiro tempo que provavelmente está entre seus melhores 45 minutos de futebol na Copa do Mundo da FIFA e em que abriu vantagem de um gol com Robinho – e que poderia ter sido até mais -, a equipe brasileira sucumbiu. Não foi com a velocidade de seu ataque, mas sim pelo alto, que os holandeses viraram o jogo em Port Elizabeth. Wesley Sneijder marcou os dois gols, o primeiro aos oito minutos do segundo tempo, em cruzamento que contou com erro de Júlio César e Felipe Melo. O outro foi de cabeça, decretando o 2 a 1 que eliminou o time de Dunga na mesma fase em que o pais caíra na Alemanha 2006.
Com 100% de aproveitamento na Copa até aqui, a Holanda enfrenta na semifinal o Uruguai, que garantiu a vaga ao derrotar a seleção de Gana por 4 a 2 na disputa de pênaltis (após empate em 1 a 1 no tempo regulamentar e prorrogação), nesta sexta-feira, no Soccer City de Johanesburgo. A partida acontece no dia 6, terça-feira, na Cidade do Cabo.
O gol que muda
Pois todos prognósticos de uma partida travada - entre duas equipes que preferem aguardar serem atacadas para, então, se aproveitarem dos espaços - se confirmaram a princípio. Tanto brasileiros como holandeses permaneciam quase todos atrás do meio-campo no momento em que o rival tinha posse de bola. Pelo primeiros minutos já se percebia: tinha quase tudo para ser um jogo para paciência e estudo.
Isso, claro, a não ser que alguém conseguisse abrir o placar cedo e levar abaixo todas as perspectivas de cautela. E foi o Brasil quem encontrou um caminho para isso. Primeiro, aos oito minutos, com uma surpreendente entrada de Daniel Alves pela esquerda, onde recebeu livre de Luís Fabiano e passou para Robinho marcar. Daniel, no entanto, estava à frente da zaga no momento do lançamento.
Mas que não fosse por isso. Dois minutos depois, Robinho tratou de ratificar que quem começava levando perigo era o Brasil. A defesa holandesa se confundiu e ninguém seguiu o camisa 11 em seu deslocamento da direita para o meio. Felipe Melo enxergou com perfeição e, de trás do meio-campo, acertou um lindo passe que deixou o atacante do Santos na cara do gol. De primeira, ele tocou na saída de Maarten Stekelenburg.
Espaço a quem quer espaço
Não é que o 1 a 0 no placar fosse a senha para uma Holanda desguarnecida, mas aos poucos a marcação do trio Arjen Robben-Wesley Sneijder-Dirk Kuyt e do centroavante Robin Van Persie se adiantou em direção ao campo brasileiro. Se não era uma situação clara para contragolpes, passava a ser, aos poucos, um cenário mais propício para a criação de chances.
De um lado, a Oranje incomodou, cruzou à área, acertou um ou outro chute de longe, mas não conseguiu de fato assustar Júlio César. E o Brasil, em algumas poucas e talentosas investidas, chegou perto do segundo gol: primeiro, aos 26, quando Daniel Alves fez boa jogada pela direita após cobrança de escanteio e cruzou para Juan chutar forte, da entrada da pequena área, por cima do gol.
Os únicos autênticos contra-ataques quase resultaram em gols. Um de Kaká: depois de bela jogada de Robinho pela ponta-esquerda, Luís Fabiano ajeitou de calcanhar e o camisa dez, da entrada da área, acertou sua típica finalização consciente, de chapa, no canto alto esquerdo. Stekelenburg fez uma defesaça. E, já nos acréscimos, foi Maicon quem desceu como uma bala pela direita e bateu firme, na rede pelo lado de fora. O Brasil não chegava a toda hora, mas, quando o fazia, era sempre beirando a precisão. O jogo já se parecia com aquele de que a equipe de Dunga gosta.
O outro gol que muda
De novo: a pauta estava aparentemente marcada para uma partida com mais espaços brasileiros a não ser que um gol aparecesse logo no início e mudasse tudo. A história se repetiu, dessa vez para o outro lado e de um jeito pouco usual. Primeiro, porque num levantamento holandês para a área. Segundo, por algo pouquíssimo habitual na defesa brasileira: falha de posicionamento quando Sneijder cruzou fechado. A bola passou por toda a área, triscou na cabeça de Felipe Melo – que se chocou com Júlio César – e foi direta para o canto direito. Sete minutos de jogo; tudo igual.
Com o empate e uma Holanda entusiasmada, era possível sentir no ar: a Seleção Brasileira estava diante de sua primeira situação de pressão na Copa. Como a equipe reagiu? A princípio, tomando iniciativa e criando chances, sobretudo uma de Kaká aos 20 minutos, quando tentou encobrir Stekelenburg no rebote de um cruzamento e tocou com categoria, a centímetros da trave. Mas, então, o imponderável – no caso, o mesmo imponderável. Foi um escanteio vindo da direita, aos 23 minutos: Kuyt desviou de cabeça e ninguém marcou Sneijder. O meio-campista da Inter de Milão, normalmente aquele que cruza as bolas na área, completou de cabeça – algo tão pouco comum que ele próprio comemorou apontando para a própria testa em incredulidade. Pela primeira vez no Mundial, o Brasil estava atrás no placar.
E, por se não fosse pressão o suficiente, cinco minutos depois do gol os brasileiros passaram a jogar com um a menos, quando Felipe Melo recebeu um vermelho apos acertar Robben depois de lhe cometer uma falta. Os espaços agora eram escandalosos e para a Holanda. E a pressão, algo desordenada, algo nervosa, dos brasileiros. O suficiente para transformar, nos últimos 20 minutos, o estádio de Port Elizabeth num caldeirão de nervosismo, mas não para buscar o empate. O sonho do hexa acabou em 45 minutos. Agora, só em casa, dentro de quatro anos.
FIFA.com
A enorme expectativa em torno do duelo entre Brasil e Holanda pelas quartas de final da Copa do Mundo da FIFA 2010 não vem por acaso. Mais do que a tradição que ambos possuem, a certeza de uma partida bem disputada e de alto nível técnico já mexe com os torcedores que irão nesta sexta-feira ao Estádio Nelson Mandela Bay, em Port Elizabeth. Foi desta forma que os outros confrontos ficaram marcados e é assim que o próximo deve entrar para a história.
Brasil e Holanda se enfrentaram nove vezes, sendo três em Mundiais, com uma vitória para cada lado e um empate. O primeir encontro na Alemanha 1974, quando o “Carrossel Holandês” liderado por Johan Cruyff confirmou a supremacia mostrada ao longo da competição com uma vitória por 2 a 0. Johan Neeskens e o próprio Cruyff fizeram os gols no segundo tempo de um jogo nervoso e que também ficou lembrado por entradas duras e pela expulsão de Luís Pereira.
O segundo aconteceu 20 anos mais tarde, em Dallas. No dia 9 de julho de 1994, a tensão também esteve presente, mas desta vez por conta das reviravoltas no placar. Melhor em campo, a Seleção Brasileira abriu 2 a 0 com gols de Romário e Bebeto e deu a impressão de que chegaria a um triunfo sem sustos. No entanto, Dennis Bergkamp e Aron Winter empataram, e Branco, em cobrança de falta perfeita, selou o triunfo por 3 a 2.
Técnico da equipe na ocasião, Carlos Alberto Parreira não hesitou em apontar a partida como decisiva na campanha do tetracampeonato. “Estávamos vencendo por 2 a 0 e jogando bem, mas, de repente, a Holanda voltou. Eles tinham um time muito técnico, não desistiam nunca e mantiveram a filosofia de atacar sempre”, lembrou Parreira ao FIFA.com, em uma série de entrevistas realizadas com os campeões mundiais de 1994. “Por isso foi um jogo tão interessante, o melhor da Copa.”
Na França 1998 veio a oportunidade do tira-teima, desta vez pela semifinal. Mais uma vez o estilo ousado e ofensivo de ambos os países se fez presente, com diversas chances de gol para cada lado. Ronaldo abriu o placar, mas Patrick Kluivert empatou no final do tempo regulamentar, com o 1 a 1 perdurando até o término da prorrogação. Na cobrança de pênaltis, Taffarel voltou a ser herói ao defender as cobranças de Phillip Cocu e Ronald de Boer.
FIFA.com
Jogar um futebol vistoso, tanto quanto ganhar, carrega consigo um peso; uma responsabilidade. A fama passa a preceder o desempenho. Parece que em alguns países, como Brasil e Holanda, a pressão natural de se vencer uma partida nunca é completamente superada se, além da vitória, a equipe não demonstrar também um espetáculo condizente com a história de quem já teve esquadrões como a Seleção de 1970 ou a Laranja Mecânica de 1974.
E o que acontece, então, quando dois países como esses se encontram? O que esperar de quem tem tanta tradição de jogo ofensivo numa partida decisiva como a da próxima sexta-feira, em Port Elizabeth? A resposta “um jogaço aberto” pode até acabar sendo a verdadeira, mas, para as seleções brasileira e holandesa que estão na África do Sul 2010, a análise é ligeiramente mais complexa. Passa pelas opções táticas de Dunga e de Bert Van Marwijk e pelas semelhanças que guardam entre si.
Não deixa de ser curioso: tanto Brasil quanto Holanda chegam invictos às quartas de final da Copa do Mundo da FIFA e com campanhas parecidas – os brasileiros, com três vitórias e um empate, e os holandeses, com quatro triunfos; uns com oito gols a favor e os outros, com sete; ambos com apenas dois sofridos. E, no entanto, os dois lados tendem a escutar um mesmo senão ecoando desde seus países: por que a equipe não joga mais à frente; não toma mais iniciativa? A resposta está na capacidade de sair em velocidade para contra-atacar, a arma que tem caracterizado brasileiros e holandeses nestes últimos vitoriosos tempos.
“Das equipes europeias, a Holanda talvez seja a que tem uma qualidade técnica mais próxima daquela dos sul-americanos”, analisa Dunga ao comentar a rapidez e a qualidade com que Arjen Robben, Wesley Sneijder e companhia são capazes de liquidar suas partidas. “Eles têm tradição de formar equipes que jogam bem. Não é uma equipe que só marca, ou que só tem jogadas de bola longa. Eles têm jogadores de muita técnica e nós temos que estar prontos para isso".
Diz muito a respeito da semelhança entre as duas equipes o fato de que, ao passo que Dunga destaca a proximidade dos holandeses com aquilo que normalmente vem da América do Sul, Van Marwijk chama atenção para um aspecto brasileiro que soa como virtude europeia: a solidez defensiva. “ O Brasil tem uma linha defensiva com seis jogadores impressionantes, além, claro, de jogadores ofensivos prontos para fazer a diferença. É uma equipe sólida”, resume o treinador holandês, usando palavras que provavelmente caberiam para descrever sua própria seleção.
Quem pisca primeiro?
Equilibradas entre uma defesa bem postada e um ataque veloz e mortal, tanto Brasil quanto Holanda se sentem mais cômodos quando o adversário toma a iniciativa, ataca e, com isso, abre espaços. A tendência, então, é a de que a partida das quartas de final tenha algo de jogo de xadrez; de entender quem tratará de partir para cima, mesmo sabendo do perigo que significa fazê-lo diante de um adversário com contra-ataque tão mortal.
“Precisamos estudar com calma as atuações dos holandeses, mas com certeza é uma equipe que vai jogar. Não sei se vai nos agredir, mas vai entrar para jogar”, previu Kaká pouco depois dos 3 a 0 sobre um Chile que também entrou nas oitavas de final para jogar – até mesmo agredir – e pagou caro por isso. Os olhos do centroavante Luís Fabiano até brilham só de pensar em mais um jogo em que possa ter espaços, e não em que enfrente uma retranca. “Pelo que eu pude perceber, a Holanda ataca bastante e tem jogadores de características ofensivas. Acho que eles vão partir para cima de nós e buscar o resultado. Por isso, temos que ter cuidado, porque eles são muito perigosos”, analisa o camisa nove. “Por outro lado, toda seleção que parte para cima do Brasil corres sérios riscos.”
Nem é preciso avisar Bert Van Marwijk sobre isso. Se sua equipe já tem ganho fama por permanecer à espreita, aguardando a hora certa de dar o bote, contra um rival que age da mesma maneira – e é no mínimo tão perigoso quanto -, o treinador já prevê um cenário diferente. “Em todas as nossas partidas até agora, nós tivemos controle do jogo: fizemos sete gols e levamos apenas dois e praticamente não corremos riscos. Mas acho que isso vai mudar na partida contra o Brasil”, admite o técnico holandês.
Tanto brasileiros quanto holandeses vêm de campanhas brilhantes nas eliminatórias e vitórias consecutivas na África do Sul. Enquanto uns têm Robinho voando para puxar contra-ataques pela esquerda, outros têm Dirk Kuyt. Para um Kaká resolvendo jogadas rápidas na base das arrancadas, a resposta é um Arjen Robben. Luís Fabiano de matador de um lado, Robin Van Persie do outro. Armas e propostas parecidas, talvez parecidas até demais. Mas alguém, cedo ou tarde, terá que ceder. Quem? E, principalmente, como?
FIFA.com
Além da classificação para as quartas de final da Copa do Mundo da FIFA, o atacante Robinho tinha outro motivo para comemorar na noite desta segunda-feira. Com o gol que fez na vitória por 3 a 0, ele igualou marca de Pelé como maior artilheiro dos confrontos entre Brasil e Chile, com oito gols. Mesmo feliz pelo feito, ele preferiu não ir além nas comparações.
“Pelé é um jogador incomparável, tive a felicidade de fazer oito gols também. Tenho sorte contra o Chile”, declarou o atacante, que, por outro lado, fez na partida apenas o seu primeiro gol em Copas do Mundo da FIFA.
Dos oito gols de Robinho contra os chilenos, sete aconteceram nos seis jogos que a seleção disputou contra os rivais sob o comando de Dunga. O camisa 11 da Seleção, que disputa o segundo Mundial de sua carreira, também comentou a felicidade de enfim ter deixado sua marca.
“Fico muito feliz por ter feito meu primeiro gol em uma Copa do Mundo, mas claro que estou mais contente pela vitória da equipe”, explicou o jogador, eleito pelos leitores do FIFA.com como o craque do jogo. “Meu projeto principal agora é ser campeão do mundo. Depois, se for possível ser o melhor do mundo, ótimo. Mas agora estou pensando só no conjunto, no grupo, nas conquistas coletivas. As conquistas individuais deixo para segundo plano.”
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