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Coronavírus e suas consequências na perspectiva de Durkheim

"Nem tudo o que brilha é relíquia, nem joia".

Em momentos de crise, pandemia e busca de respostas ou melhores formas para entender a situação, retomo a teoria clássica de Emile Durkheim, um dos pais fundadores da Sociologia, e proponho algumas reflexões sobre os dias atuais em que vivemos uma profunda crise desencadeada pela pandemia do Novo Coronavírus (Covid-19) que mudou o funcionamento da vida social em todo mundo.

Durkheim criticava como aconteceu o processo de modernização e desenvolvimento de um sistema que não priorizava questões humanas ou sociais, e sim a produtividade e o aumento dos lucros, dessa forma, a crise gerada pelo Novo Coronavírus, seria um agravador desse cenário. O autor buscou entender o funcionamento das sociedades modernas a partir da importância da divisão do trabalho social, pois as pessoas "interdependem" cada vez mais da sociedade. Essa lógica de interdependência é fundada no fato de que cada indivíduo produz apenas sua parte específica e depende do trabalho do outro, por exemplo o motorista ao final de uma jornada de trabalho, depende do trabalho dos cozinheiros ou mesmo de padeiros – já que as atividades são muito especializadas, e com o adensamento das sociedades, requerem uma divisão maior do trabalho.

Assim, essa divisão social do trabalho torna-se uma necessidade e está presente em todas as formas de produção como indústria, comércio, agricultura e todas as demais esferas da vida social, como filosofia, política e direito. Ela tem como efeito mais notável tornar as funções sociais específicas e mais conectadas, não é necessariamente o mesmo que aumentar o rendimento das funções divididas, mas sim de gerar uma necessidade comum, que aglutina os indivíduos como uma sociedade, ou seja, que junte às pessoas. A divisão do trabalho social gera uma consciência comum às pessoas a partir de suas experiências comuns, que garante a coesão da sociedade.

Aqui já pensando na atual conjuntura, a existência da coesão social se relaciona com a tensão entre solidariedade e anomia, já que a solidariedade interna da sociedade se baseia sobretudo na interação de cada um na divisão do trabalho social e, a anomia é uma manifestação da falta de adesão a esses mecanismos de solidariedade, podemos citar como exemplo a falta de adesão às regras e normas sociais que torna precária a vida e enfraquece laços sociais. Com isso, em períodos de grandes crises, como esse, em que a divisão do trabalho não produz contatos suficientemente eficazes entre os indivíduos, nem regulações adequadas das relações sociais, o panorama que se tem é o de afrouxamento de expectativas morais de comportamento, o que pode gerar graves problemáticas sociais, como o aprofundamento da desregulamentação do mundo do trabalho e problemas psicossociais, por exemplo.

Outro ponto importante da teoria de Durkheim é quando há uma ruptura dessa solidariedade social, é necessário que entrem em ação referências fortes, ou seja, forças que mantenham a coesão entre as sociedades. Portanto, onde a divisão do trabalho se torna anômica devido a instabilidade, falta de regras, ou grandes perturbações como a pandemia que vivemos que aguçam esse estado de anomia, o sociólogo afirma que quanto mais uma organização é complexa, mais a necessidade de uma regulamentação extensa se faz sentir. Chamo atenção então para o debate sobre a necessidade de lideranças eficazes (uma vez que apenas força ou legalidade não constitui uma liderança conforme afirma outro sociólogo clássico, Max Weber) com conhecimento técnico e que consigam realizar um gerenciamento de crises de forma eficaz para que a sociedade se mantenha coesa. E isso inclui desde lideranças locais, municipais aos chefes de Estado.

No Brasil verificamos uma triste situação, em que líderes eleitos contrariam indicações técnicas da Organização Mundial da Saúde gerando confusão e agravando as consequências dessa pandemia, arriscando assim vidas da população em nome de um pretenso desenvolvimento econômico. Talvez o Novo Coronavírus possa nos ensinar muitas lições.

*Agradecimento especial aos comentários do sociólogo Thárcio Elizio ao texto.

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